segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O dia que júpiter encontrou saturno


…(Silêncio)







-Quando a noite chegar cedo e a neve cobrir as ruas, ficarei o dia inteiro na cama pensando em dormir com você.






-Quando estiver muito quente, me dará uma moleza de balançar devagarinho na rede pensando em dormir com você.






-Vou te escrever carta e não te mandar.




-Vou tentar recompor teu rosto sem conseguir.


-Vou ver Júpiter e me lembrar de você.


-Vou ver Saturno e me lembrar de você.


-Daqui a vinte anos voltarão a se encontrar.


-O tempo não existe.


-O tempo existe, sim, e devora.


-Vou procurar teu cheiro no corpo de outra mulher. Sem encontrar, porque terei esquecido.Alfazema?


-Alecrim. Quando eu olhar a noite enorme do Equador, pensarei se tudo isso foi um encontro ou uma despedida.

 -E que uma palavra ou um gesto, seu ou meu, seria suficiente para modificar nossos roteiros.


(Silêncio)


-Mas não seria natural.


-Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem.


-Natural é encontrar. Natural é perder.


-Linhas paralelas se encontram no infinito.


-O infinito não acaba. O infinito é nunca. -Ou sempre.


(Silêncio)


-Tudo isso é muito abstrato. Está tocando “Kiss, kiss, kiss”. Por que você não me convida para dormirmos juntos.


-Você quer dormir comigo? -Não.


-Porque não é preciso?


 -Porque não é preciso.
(Silêncio)
-Me beija.


-Te beijo.
Caio Fernando Abreu em Morangos

Nenhum comentário:

Postar um comentário